O Voto Consciente

Época de eleições sempre é muito agitada. Incrível como muitos aspectos da política se assemelha com religião, dado o fervor com que os adeptos de um ou outro candidato discutem. Seria esta tendência a unir toda forma de poder e, consequentemente, toda forma de defender este poder algo intrínseco de nossa personalidade? Este é um bom tema para trabalhos de psicologia evolutiva, mas não é sobre isso que quero escrever agora. O assunto deste tópico na verdade é um pouco mais amplo, para abordar e discutir pequenos aspectos de nosso processo eleitoral.

Em primeiro lugar, por que é que temos eleições? Acho que a resposta mais óbvia é que nosso sistema é de uma democracia indireta, ou seja, o povo em si não participa de todos os passos da elaboração das leis e do governo em si, mas na verdade, elege seus representantes. No Brasil elegemos diretamente representantes para os poderes executivo e legislativo.

O primeiro aspecto que quero discutir é sobre justamente o processo de eleição. O voto no Brasil é obrigatório. Todo cidadão acima de 18 anos tem o dever de comparecer no dia e período pré-determinada à sua seção eleitoral e depositar seu voto na urna. O voto é facultativo apenas para jovens entre 16 e 18 anos e eleitores com mais de 70, de acordo com a Constituição Federal em seu artigo 14. Embora haja discussão sobre isso, penso que se trata de termos o dever de exercer nosso direito de escolher nossos representantes! Isso soa muito estranho. Entretanto, para um povo que precisa de uma lei para não votar em políticos corruptos talvez não seja tão estranha assim. Na realidade, parece existir um medo generalizado da classe política de nos dar efetivamente este direito. Um medo de haver um esvaziamento de eleitores pelo menos nas primeiras eleições, o que, na minha opinião, demonstraria o tamanho da indignação do povo para com tanta corrupção vista nesta classe. Por outro lado, embora tenhamos o dever de comparecer às urnas, não somos obrigados a escolher entre um ou outro candidato. Temos a possibilidade de votar em branco ou nulo. Esta me parece a opção mais democrática e ideal para dar nosso voto de protesto. Vale lembrar que escolher esta opção implica em invalidar um voto, tornando a quantidade de votos válidos para que um candidato se eleja em primeiro turno, por exemplo, menor.

Outra questão importante de nossas eleições é a quantidade de votos que um candidato precisa ter para ser eleito. Nas eleições majoritárias, ou seja, do poder executivo (prefeitos, governadores e presidente) e do senado, quem obtiver mais votos ganha, havendo segundo turno para o poder executivo se nenhum candidato alcançar maioria absoluta dos votos válidos no primeiro turno. Já para vereadores, deputados estaduais, distrital e federais, as eleições são proporcionais e a eleição de determinado candidato depende de um cálculo chamado de quociente eleitoral. O quociente eleitoral é determinado pelo número de votos válidos dividido pelo número de cadeiras do cargo. Também é necessário se obter o quociente partidário, que é o número de cadeiras a que tem direito determinado partido ou coligação. Este número é dado pelo número de votos obtidos pelo partido ou coligação, dividido pelo quociente eleitoral. Existem alguns critérios de arredondamento que não vem ao caso agora. Por exemplo, digamos que em determinada eleição para deputado federal houve 10 milhões de votos válidos para 100 cadeiras. Isto dá um quociente eleitoral de 100 mil. Suponha também que um determinado partido recebeu 320 mil votos, tendo assim um coeficiente partidário de 3,2, ou seja, possui três vagas, elegendo os três candidatos mais votados. Agora, imagine que este partido tinha 10 candidatos e que seu candidato mais votado teve 280 mil votos, o segundo mais votado teve 30 mil votos e o terceiro mais votado teve 5 mil votos, sendo o restante distribuído entre os demais candidatos. Isto significa que um candidato será eleito com 5% do quociente eleitoral. Suponha também que um outro partido teve 90 mil votos distribuídos entre dois candidatos. Isto significa que um candidato com 45 mil votos não será eleito, enquanto aquele outro com cinco mil votos sim.

Esta questão do quociente eleitoral não parece uma grande injustiça? Uma pessoa com mais votos não consegue se eleger enquanto outra com menos votos, sim? Por que então existe este sistema? A resposta básica é que desta forma é possível levar em consideração o direito das minorias. Digamos que aquele candidato que teve 30 mil votos do primeiro partido citado represente uma região desfavorecida de determinado Estado ou uma determinada classe social que não terá votos suficientes para eleger um candidato pela maioria direta. Como esta parcela da população será representada? Tendo em vista que as regiões metropolitanas das capitais brasileiras representa grande parte do eleitorado, regiões menos populosas vão perder muito com a perda da representatividade. Este é o principal motivo pelo qual as eleições proporcionais são baseadas no quociente eleitoral. Além disso, este esquema permite o voto na legenda, que seria impossível em outra forma de eleição. Acredito que as maiores objeções a este modelo venham à tona por alguns motivos bem pontuais. Por exemplo, nesta última eleição para deputados federais, o Estado de São Paulo elegeu o palhaço Tiririca com mais de 1,3 milhões de votos. O fato de eleger Tiririca por si não é o maior dos problemas, mas o fato de com isso ele levar vários candidatos que não se elegeriam de outra forma é preocupante. Alguns deles estão envolvidos em investigações sobre corrupção mas não foram ainda condenados por um órgão colegiado e, por isso, não caíram nas malhas da lei da Ficha Limpa. É óbvio que isso irrita pessoas que estão antenadas nos acontecimentos políticos do Brasil.

É por isso que precisamos divulgar estas informações. Partidos e coligações pequenas usam este artifício lançando candidaturas de figuras públicas para alavancar a eleição de nomes desgastados ou de pouca penetração política. Se for votar por protesto, o voto em branco ou nulo talvez seja mais interessante, embora ele diminua o número de votos válidos e, com isso, o quociente eleitoral.

Talvez a melhor forma de votar, neste sentido, é votar sabendo em quem está votando. Para isso, existem alguns sites que informam todo o histórico político dos candidatos, como o Excelências – Transparência Brasil. Veja quais foram seus projetos, no que votaram, quando faltaram. Com isso o voto fica mais consciente.

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Mais informações sobre o quociente eleitoral: http://pt.wikipedia.org/wiki/Quociente_eleitoral

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